terça-feira, 28 de setembro de 2010

Jesus, a pecadora pública e o fariseu

O objetivo deste artigo é saber, qual à atitude de Jesus diante de um fato concreto, onde a questão moral sexual está subjacente? E sua atitude, pode lançar luz sobre o modo como devemos hoje enfocar a moral sexual?
Texto bíblico escolhido para iluminar estes questionamentos é o de Lc 7, 36-50. O tema não é focado de maneira explícita no episódio, mas aparece como pano de fundo. Pecadora pública, supostamente prostituta.
O artigo está dividido em 5 partes: 1°- abordagem histórica, 2°- contexto literário, 3°- composição do texto Lc 7,36-50, 4°- mensagem, 5°- conclusão.

I – Contexto histórico
Lucas inicia a perícope com uma cena em que Jesus foi convidado para um banquete na casa de um fariseu. Logo no inicio (v36) diz que Jesus “reclinou-se à mesa”, denota um tratamento de honra em relação a Jesus, supostamente considerado o profeta esperado (v39). A entrada de uma mulher sem convite não era algo surpreendente num festim deste tipo, pois tinha um caráter mais ou menos público.
Surpreendente era a condição da mulher, e os gestos realizados por ela. A atitude de Jesus foi paradigmática em relação à pecadora. Vejamos a condição da mulher na sociedade vigente:
• Sociedade judaica: seres inferiores, vulneráveis e tentadoras (Gn3).
• Lei de Israel: mulher propriedade do pai ou do marido, subalterna ao homem.
• Não era sujeito nem pela esfera religiosa nem no direito civil
As mulheres ao saírem de casa traziam o rosto e a cabeça cobertos por véu. No texto quando ela tira o véu dá-se o escândalo, enxuga os pés de Jesus com os cabelos.
A inferioridade da mulher era marcada pela corporeidade. Pois bem, as classes que acompanharam Jesus em sua trajetória histórica foram: as prostitutas, os publicanos, e os pecadores.

II – Contexto literário
Na visão lucana a história da salvação divide-se em duas etapas: o Tempo da Promessa e o Tempo do Cumprimento ou Realização. O primeiro testamento constitui o Tempo da Promessa, e a realização se dá no tempo de Jesus e no Tempo da Igreja.
Lucas introduz a vida pública de Jesus no episódio da sinagoga em Nazaré (Lc 4,16-30). Ao ler o livro do profeta Isaías apresenta Jesus como Messias e traça o seu programa de vida, a síntese da sua missão. Vejamos a síntese literária deste capítulo:
• V. 1-10 – cura do servo do centurião, Jesus revela a misericórdia de Deus com os pagãos
• * V. 11-17 – ressurreição do filho da viúva de Naim, reaparece a misericórdia de Deus, atitude de Jesus – Elias.
• V. 18-23 – Jesus se revela como Messias aos discípulos de João Batista.
• V. 24-35 – Lc faz elogio a João e termina com uma interpelação: será que realmente é o Profeta esperado?
• * V. 36-50 – narração própria de Lucas.

III – Composição do texto Lc 7,36-50
Muitos exegetas afirmam que Lucas parte neste relato do episódio da unção de Betânia (Mc 14,3-9). Mas logo se afasta da fonte e compõe uma narrativa independente. (Artigo elementos semelhantes e divergentes) Em ambas as narrativas Jesus sai em defesa da mulher contra seus acusadores.
Estrutura do texto:
• V. 36-38 – colocação do problema: mulher pecadora (prostituta?), entra na casa e expressa sentimentos em relação a Jesus através de gestos. Jesus deixa-o agir – rompe patrões de comportamento.
• V. 39 – o raciocínio do fariseu se opõe a pecadora: mulher (= pecadora) toca Jesus (=profeta?). Expectativa:
pecado julgamento condenação expulsão
• V. 40-47 – argumentação de Jesus se dá em dois passos.
1º - V. 40-43 – Jesus retoma o argumento do fariseu com a parábola, esquematizada assim:
Dívida maior----- perdão maior----- amor maior
Subtendido:
Dívida menor------perdão menor------ amor menor
Jesus parte da noção de pecado – perdão – amor
2º V. 44-46 – começa descrevendo os gestos da mulher, expressões múltiplas de amor e gratidão, estrutura do raciocínio:
AMOR MAIOR------ PERDÃO MAIOR
AMOR MENOR ....
Jesus exorta a olhar de seus interlocutores aos pobres e pecadores, depois a si mesmos. Fariseu ilustre da cidade deve imitara a pecadora, ele assume passa a ser um discípulo seu.
• V. 47 – os gestos dela simbolizam que o perdão veio primeiro, ela demonstrou amor.
• V.48-49 – perdão e o espanto dos convivas, forma de caracterizar a boa nova
• V.50 – “tua fé te salvou”, refere-se a tradição batismal e a acolhida na comunidade dos seus

IV – A mensagem do texto
• O tema da misericórdia – com-paixão
• A com-paixão nas palavras de Jesus
• A com-paixão nos atos de Jesus
• A Sabedoria e a com-paixão em Lc 7,36-50

V – Conclusão
Que orientações podem ser tiradas deste texto para um possível avanço na moral sexual?
1° - O pecado de ordem sexual não é tratado dentro de uma especificidade à parte, levanta um questionamento com relação a rigidez da Igreja.
2° - Paoli observa, Jesus reconstrói a partir dos gestos da pecadora o significado de um relacionamento verdadeiro. Comportamento exigido dos seguidores de Jesus, partir daquilo que há de amoroso nos gestos.
3° - Entrar na dinâmica da gratuidade e do amor, renunciando a tentação da auto-suficiência e do domínio do sagrado. Fariseu pretendia ter o controle de Deus, a partir do controle da Lei e do Templo.

REFERÊNCIA BIBLIOGRAFICA
CAVALCANTI, Tereza. Jesus, a pecadora pública e o fariseu. Estudos Bíblicos, 24, Petrópolis: Vozes, p.30-40, 1989. [Lc 7,36-50]
Rodrigo J. da Silva